Friday, April 19, 2019
Vieira de Castro _ 75 anos _ A História do Nosso Sabor
"Desculpa-me avô…
Ainda hoje não consigo enunciar os nomes de todas as ruas, perpendiculares e paralelas, sem hesitações, e na ordem correcta… do percurso de casa até à Versailles. Isto apesar do teu gigantesco esforço…
… mas MUITO obrigado."
Os momentos em que crianças acompanham adultos em romarias para aquisição de guloseimas em quadras festivas, é positivamente marcante para as referidas crianças, e eventualmente para os referidos adultos.
Esses contextos são já por si festivos, o que ajuda à existência de um ambiente favorável ao armazenamento e preservação de memórias positivas.
Para tal, também contribui o facto de as ditas romarias terem como objectivo, trazer para casa nutrientes, regra geral, altamente calóricos, e, carregadinhos de SABORES intensos : b
Em nossa casa essa tarefa cabia maioritariamente ao meu avô.
As motivações eram várias, e transbordavam abundantemente para fora das quadras festivas, embora estas estivessem de facto associadas a picos de intensidade desta práctica.
Nesse capítulo, o Natal reunia forçosamente o maior número de iguarias, e consequentemente, de respectivas romarias gulosas. O maravilhoso bacalhau da av. da igreja, cortado em deliciosas postas altas, que eram depois cozidas no ponto, e saboreadas com grão e cove… ou o delicioso bolo-rei da Versailles, preferencialmente para o mal cozido… Uau.
Estas iguarias, adicionadas a outras, também maravilhosas mas de fabrico caseiro, geralmente confeccionadas em animados serões, encontravam-se à mesa da consoada, cercadas pela família em intensa comunhão… Que sonho.
Agora é Páscoa. Por esta altura a romaria era às diferentes variedades de amêndoas, com que se enchiam pequenas taças, que viviam a quadra em cima da mesa, sendo debicadas a cada passagem pela casa-de-jantar.
Muitas vezes estas deslocações tinham como objectivo original o mero acto de passear, e a aquisição de guloseimas surgia como um delicioso acidente de percurso. Disso eram exemplo os maravilhosos almendrados do "2000", ou, dessa mesma pastelaria do campo-pequeno, os fantásticos petit-fours.
Tantas vezes que os nossos passeios a pé se fizeram por aí.
Esses passeios diários do meu avô, a pé por Lisboa, constituíam um ritual que na família lhe está indelevelmente associado.
Fruto dos meus horários na escola, essencialmente matinais, eu tinha a sorte de ser repescado para essa actividade com grande regularidade, e, nesses dias, esses passeios assumiam para si uma dupla função. Além do exercício físico que possibilitavam, o meu avô via nesses momentos a oportunidade de me instruir no conhecimento profundo do desenho e articulação das ruas da cidade, bem como nos seus respectivos nomes. Assim, cada cruzamento era acompanhado pela pergunta:
"… e esta, como se chama?…"
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