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Monday, October 7, 2024

[ Pinóquio aquém véu ]


 

O espírito que habitava o pequeno corpo de madeira, sonhava sentir o calor de pele ao pousar o rosto sobre o seu próprio braço, quando deitado. Sonhava com a maciez muscular do antebraço a amparar o seu descanso. A confortável suavidade quente de uma perna sobre a outra, ao repousar na cama.

Sonhava ainda com a retribuição do calor corporal nos abraços recebidos.

Com a capacidade de acolher outro corpo nesse abraço, sem o magoar, nem provocar a retracção ao toque frio da madeira polida e encerada.

Sonhava ser aceite como igual, e que a sua natureza, sobre a qual ele nada podia, não fosse por si só factor de exclusão ou repulsa.

Por mais que tudo isto fosse desejado, e no silêncio da noite repetidamente sussurrado em orações profundamente sentidas, a satisfação de tal pedido não lhe era concedida… Noite, após noite, após noite…

Agora, mal Pinóquio sonhava que toda essa contrariedade tinha sido por si desenhada  além véu, antes… no planeamento geral da sua vinda, aquando da definição das etapas a percorrer e das aprendizagens a incorporar.

Duro é o caminho na cegueira de aquém véu.


Esta ilustração foi inicialmente concebida enquanto proposta, para o manual do 10° ano, de filosofia, da Porto editora, dando depois lugar a uma outra versão definitiva.

Tenho por ela um carinho especial. 

Muita força para ti Pinóquio…